Qual é o papel da reforma tributária e o do Associativismo no meio cervejeiro hoje? Vem com o Surra de Lúpulo porque hoje o papo é denso, mas muito importante não apenas para os consumidores de cervejas que nos leem, mas também, e principalmente para os donos de cervejarias do nosso país.
Lud (IPAcondriaca) e Estevão (da Suricato) conversam com Márcio Maciel, que é presidente do SINDICERV e veio nos ajudar a entender o tamanho das batalhas que a cerveja está enfrentando neste momento. Ouça o episódio na íntegra:
Reforma tributária, regulações e Associativismo
A cerveja é muito mais do que uma simples bebida no Brasil; ela faz parte da nossa cultura, do nosso jeitinho de socializar e até da construção da sociedade. Mas por que ficar apenas no senso comum e nos achismos, se temos dados fresquinhos para aprofundar essa conversa?
Uma pesquisa recente do Instituto Locomotiva revelou números que reforçam a conexão dos brasileiros com a cerveja:
- 85% acreditam que compartilhar uma cerveja com os amigos é uma tradição cultural do país;
- 83% escolhem a cerveja como a principal bebida para festas e celebrações.
E tem mais:
- 6 em cada 10 brasileiros são contra o aumento de impostos sobre a cerveja;
- 70% afirmam que o imposto atual já é alto e não deveria aumentar.
Com essas informações, e nesse episódio, vamos explorar como esses dados impactam a nossa relação com a cerveja e o que isso pode nos ensinar sobre cultura, economia e, claro, os bons momentos que ela proporciona.
Reforma Tributária:
O sistema tributário brasileiro é amplamente visto como algo complexo. No caso das cervejas, cinco impostos recaem sobre o produto: PIS, COFINS, ISS, ICMS e IPI. Essa estrutura resulta em uma carga tributária média de impressionantes 56%, a mais alta da América Latina. Essa realidade prejudica não apenas a competitividade das cervejarias nacionais, mas também o potencial de crescimento do setor.
A Proposta de Mudança: Um Novo Modelo de Tributação
A proposta da reforma tributária busca simplificar esse cenário, substituindo os cinco impostos existentes por dois principais: IVA dual (CBS e IBS) e um imposto seletivo. Enquanto o IVA será aplicado de forma uniforme, o imposto seletivo, também conhecido como “imposto do pecado”, vai incidir sobre produtos considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente — como bebidas alcoólicas, cigarros e alimentos com alto teor de açúcar.
Para o setor cervejeiro, essas mudanças representam um dos maiores desafios tributários do século. A simplificação pode trazer benefícios operacionais, mas também levanta preocupações sobre possíveis aumentos na carga tributária e impactos no consumo.
O Que o Setor Defende?
Diante desse cenário, o setor cervejeiro tem levantado três bandeiras principais:
- Imposto seletivo alinhado à OMS: O setor defende a aplicação de alíquotas progressivas, baseadas no teor alcoólico das bebidas, em conformidade com as recomendações da Organização Mundial da Saúde. Isso garantiria uma tributação mais justa entre produtos de diferentes características.
- Manutenção da carga tributária no período de transição: Entre 2026 e 2032, o setor busca evitar aumentos na carga tributária, permitindo que as empresas se adaptem ao novo sistema sem comprometer suas operações.
- Tratamento diferenciado para pequenos produtores: Como muitas cervejarias brasileiras são pequenas ou artesanais, o setor pleiteia uma tributação reduzida para esses empreendimentos. A aplicação do imposto seletivo sem um regime diferenciado poderia inviabilizar a sobrevivência de muitos desses negócios.
A reforma tributária, apesar de trazer desafios, também abre portas para oportunidades. A simplificação do sistema pode reduzir a burocracia e facilitar a operação das empresas. No entanto, a implementação do imposto seletivo exige atenção para evitar que a competitividade do setor seja prejudicada.
Hoje, mais de 2.000 projetos de lei em tramitação afetam o setor cervejeiro, sendo que cerca de 300 buscam impor restrições ao consumo de cerveja. Entre as propostas estão a proibição do consumo em locais públicos, como praias e ruas, e restrições à venda em estabelecimentos próximos a escolas.
- Motivações Diversas: Essas medidas nascem de preocupações com segurança pública, como a violência em estádios, e de vertentes mais conservadoras da sociedade que desejam restringir o consumo de álcool.
- Impacto Econômico: Aprovadas, essas medidas podem prejudicar diversos negócios — de bares e restaurantes a postos de gasolina — que dependem da venda de cerveja.
Sobre Regulamentações Restritivas: Uma Barreira ao Consumo
Restrições à Publicidade: Limitando a Voz das Marcas
Outro risco vem da tentativa de restringir a publicidade de cervejas. Embora focadas em regular a comunicação, essas propostas podem impactar negativamente a promoção de eventos, festivais e o lançamento de novos produtos.
- Dificuldade de Comunicação: A limitação da publicidade prejudica o contato direto das marcas com os consumidores, afetando a visibilidade e o crescimento do setor.
- Criatividade Sob Pressão: Regras rígidas tendem a limitar a inovação e a criatividade nas campanhas publicitárias, enfraquecendo a relação das marcas com seu público.
Logística Reversa Descentralizada
A ausência de uma legislação unificada para a logística reversa de embalagens — como latas e garrafas — cria desafios operacionais significativos para as cervejarias. Cada estado e município segue suas próprias regras, dificultando a padronização.
- Complexidade e Custos Elevados: As empresas precisam adaptar suas operações para atender legislações variadas, aumentando custos e reduzindo eficiência.
- Desestímulo à Reciclagem: Um sistema fragmentado desencoraja práticas de reaproveitamento e reciclagem, com impactos negativos no meio ambiente.
Campanhas de Desinformação
Márcio também alertou sobre a existência de campanhas de desinformação que demonizam a cerveja e promovem aumentos tributários desproporcionais no setor.
- Interesses Ocultos: Essas campanhas, em muitos casos, são movidas por setores concorrentes, como os de destilados importados, buscando benefícios próprios.
- Resposta do Setor: É essencial combater a desinformação com dados concretos, destacando os benefícios econômicos e culturais da cerveja no Brasil.
Discussões Sobre o Consumo de Álcool: Um Desafio Comportamental
Em um contexto global onde o debate sobre o consumo de álcool se intensifica, algumas vertentes defendem até mesmo a redução do consumo a zero. Isso cria a necessidade de adaptação por parte das cervejarias.
- Adaptação ao Novo Cenário: Investir em produtos com baixo teor alcoólico e promover o consumo responsável são caminhos para se alinhar às novas demandas sociais.
- Transparência na Comunicação: É fundamental que o setor comunique com clareza os riscos e os benefícios do consumo de álcool, incentivando a moderação e a responsabilidade.
Podcast “Surra de Lúpulo”, ep. 71: Barbara Gancia relata sua experiência com o alcoolismo
A Importância do Associativismo: A União Faz a Força
Outro ponto essencial levantado por Márcio Maciel é o papel do associativismo. O SINDSERV e outras entidades têm trabalhado para fortalecer a representatividade política do setor, mobilizar as cervejarias e promover o diálogo com o governo. Saiba mais sobre esse projeto clicando aqui.
O associativismo surge como um pilar estratégico para fortalecer o setor e defender seus interesses em meio a mudanças significativas. Através de entidades como o SINDSERV e a Abracerva, as cervejarias conseguem agir de forma coordenada em prol de objetivos comuns, destacando:
- Representatividade política: As associações ampliam a força política do setor, permitindo maior participação nos debates sobre a reforma tributária e regulamentações. Isso inclui levar demandas aos legisladores e promover diálogos que visam a criação de um ambiente de negócios mais justo.
- Combate à desinformação: Campanhas de comunicação conjuntas ajudam a esclarecer a população sobre temas importantes, desmistificando informações equivocadas sobre o impacto de novas leis e regulamentos.
- Defesa de interesses coletivos: Ao unir pequenos, médios e grandes players, as associações garantem que diferentes perspectivas sejam consideradas, fortalecendo o setor como um todo.
Mobilização da Base Cervejeira
O sucesso do associativismo depende do engajamento ativo de todos os envolvidos no setor. Isso significa que cervejarias de todos os portes precisam assumir um papel proativo em iniciativas como:
- Diálogo com legisladores: Participar de audiências públicas, enviar mensagens aos representantes políticos e usar redes sociais para expor preocupações são formas de influenciar as decisões políticas.
- Disseminação de informações: Informar colaboradores, fornecedores e consumidores sobre os desafios enfrentados pelo setor é essencial para construir apoio público.
- Participação em eventos e ações setoriais: Estar presente em eventos, pesquisas e iniciativas das associações fortalece a representatividade e contribui para soluções conjuntas.
Construindo um Futuro Sustentável
A união promovida pelo associativismo não é apenas uma solução para os desafios imediatos; ela também é um alicerce para um futuro mais sustentável. Ao criar um ambiente mais equilibrado para negócios, o setor cervejeiro se posiciona como um motor para o desenvolvimento econômico e a geração de empregos.
Em tempos de transformação, o associativismo não é apenas uma escolha, mas uma necessidade estratégica para que o setor cervejeiro continue crescendo e se fortalecendo. Mais do que nunca, a colaboração entre as cervejarias é o ingrediente essencial para superar obstáculos e construir um mercado próspero e resiliente.
Beba local. Beba melhor.
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