No episódio de hoje do Surra de Lúpulo, vamos falar sobre o impacto da cerveja na história da humanidade. Pra bater esse papo com a gente, convidamos João Daniel, diplomata, professor, historiador e autor do Manual do Candidato de História do Brasil (2013). Ouça na íntegra:
Deixamos o nosso agradecimento aos Mecenas Empresariais: Cerveja da Casa, Iris Pay, Cervejaria Uçá, Viveiro Van de Bergen, The Beer Agency, Prussia Bier e Passaporte Cervejeiro.
A cerveja e seu impacto na história
No começo do bate papo, perguntamos ao professor João se é verdade que a humanidade adotou o sedentarismo motivado pela produção de pães e cervejas. João explica que existe de fato um debate acadêmico muito sério a respeito dessa afirmação, sem resoluções. Para nós, do Surra de Lúpulo, é fascinante pensar que a civilização humana surgiu por conta dessa bebida âmbar que tanto amamos.
Ainda sobre o debate, João diz que os acadêmicos em sua maioria pensam que o pão foi o real motivo para o processo de sedentarismo que viria a criar a civilização como a conhecemos. Apesar de ser a hipótese mais abraçada, podemos refletir sobre os ingredientes em comum do pão e da cerveja.
“Tem gente que diz que foram 1000 anos de grupos nômades e seminômades que começaram a comer pão mesmo sem fermentar. E aí eles se sedentarizaram. Mas ainda existe esse debate.”
Povos que ajudaram a disseminar a cerveja
Os Egípcios e Fenícios foram definitivamente os dois povos que mais contribuíra, com a disseminação da cerveja.
Para os egípcios, a cerveja desempenhava um papel importante na vida cotidiana, tanto do ponto de vista social quanto religioso. A cevada era um dos grãos em maior abundância nessa região, impulsionando a produção da bebida e seu comércio. Já os Fenícios contribuíram com a disseminação da cerveja em suas feiras itinerantes, onde se vendia barris e mais barris da bebida.
“A cerveja já foi usada até como “dinheiro” no Egito, para pagar os barqueiros que chegavam pelo Rio Nilo.”
Mulheres e a cerveja
Lud, a IPAcondríaca, aponta que hoje a produção e o consumo de cervejas é muito associado à figura do homem, mas que as mulheres tiveram um papel gigantesco na produção da cerveja, afinal, as primeiras cervejeiras foram mulheres na Suméria. João diz que as mulheres se destacavam como mestras cervejeiras por conta da exigência de um tempo significativo na cozinha, uma atividade inicialmente vista como de mulher. À medida que o tempo avançava e as cervejarias eram regulamentadas, a indústria cervejeira se transformou em um empreendimento, passando a ser associada com o masculino.
“Essa pergunta se enquadra muito na história de gênero, excelente. Porque tanto a deusa egípcia Hator e a suméria, Ninkasi, eram mulheres.”
João acrescenta que tanto a deusa da cerveja egípcia, Hator quanto a deusa da cerveja suméria, Ninkasi, eram divindades muito poderosas que tinham o papel equivalente ao Dionísio, da Grécia. Ninkasi acabou sendo meio esquecidinha com o tempo, mas na antiga Mesopotâmia, era a guardiã divina da cerveja. Os sumérios, que sabiam muito bem apreciar uma cervejinha, não só a veneravam, mas davam a Ninkasi o crédito sagrado pela criação da cerveja e pelo domínio do conhecimento cervejeiro humano. A reverência dos sumérios pela deusa os fez criar o “Hino a Ninkasi”, um poema ritual que não só honrava a divindade, mas também servia como um manual prático para a arte da produção cervejeira.
“Já a Hator é a deusa da cerveja. Ela é considerada a mãe da cerveja no Egito, que tem até um templo. Além disso, ela também é vista como a Deusa Mãe, representar maternidade, fertilidade, deusa dos banquetes, da dança etc. “
Roma, Grécia e vinho – ou cerveja?
Mesmo com a cerveja sendo um sucesso no Mediterrâneo, ela não marca tanta presença na cultura Romana e na Grega. Nesse caso, o vinho ganhou espaço e pareceu dominar a história daquele período. João reflete e explica que durante muito tempo, a cerveja e a abundância da cevada permitiram que a cerveja existisse em inúmeros locais diferentes. Em algumas regiões da África, não tinha produção de cerveja. Naturalmente, os egípcios já conheciam o vinho, mas eles eram majoritariamente cervejeiros. O vinho era produzido em regiões próximas ao Nilo. Com a abundância da Uva, os gregos e a partir dos gregos, os romanos, continuaram a beber cerveja, mas começam a considerar o vinho uma bebida mais nobre. Significando que beber vinho era sinal de status social.
“Isso [de beber vinho e não cerveja] era por motivos de sofisticação e ostentação.”
E os germanos?
“Para esses povos, você bebia cerveja pra celebrar os deuses. Ao contrário do vinho que era pra celebrar os gregos e romanos.”
Enquanto Roma e Grécia se esbaldavam em vinho, os povos germanos curtiam mesmo era uma cerveja bem encorpada.
A cerveja era um assunto muito sério para povos que eram considerados bárbaros, sendo usada até na guerra. Claramente, para eles, a cerveja tinha ligação com as divindades. O ideal do “bárbaro” era morrer em combate pra ir para Valhala, o “céu dos soldados”. O fato de você morrer segurando uma espada, era muito da cultura deles, e toda a cultura deles era banhada de cerveja, João conclui.
Gostaram do nosso bate papo?
Até a próxima!
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O que bebemos durante o programa? João bebe cerveja Therezópolis; Leandro bebe Opa Bier; Lud bebe Duvel.