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Papo Aberto #4: Melissa Cole feat. Gabi Lando

ONDE OUVIR:
Capa do episódio papo aberto com Melissa Cole

Nosso papo é com a britânica, jornalista, radialista, escritora, cervejeira e juíza de concursos pelo mundo Melissa Cole, que estuda, escreve e fala de cerveja há anos. Temos também na banca, Gabriela Lando, que nos ajudará a comentar as respostas da Melissa. Leia a entrevista abaixo e ouça na íntegra:

 

 

 

✨ Esse programa não aconteceria sem os nosso Mecenas Empresariais: ✨ Cerveja da CasaIris PayCervejaria UçáViveiro Van de BergenPrussia Bier.

 

Papo aberto com Melissa Cole

 

Você é uma grande especialista em harmonização. Onde cerveja e comida se encontram? Se tiver algum truque na manga que ajude nossos ouvintes a entenderem melhor sobre harmonização com cerveja, nós adoraríamos ouvir.

 

Foto de Melissa Cole segurando cerveja. Mulher branca de camisa preta, segura copo de cerveja abaixo do queixo. Com cabelos loiros escuros, Melissa olha a câmera com um leve sorriso Então, eu adoro a questão do ponto onde comida e cerveja se encontram e a resposta pra ela é que comida e cerveja se encontram onde você quiser que eles assim o façam. Pode ser em uma cumbuca de amendoim com um pint de lager. Pode ser um pacote de batatinhas com uma pale ale. Não importa como se encontram, só o que te faz feliz.

Mas se você quer de fato elevar suas experiências com bebida e comida, acho que o caminho mais fácil que eu poderia sugerir seria começar a prestar atenção nos níveis de intensidade. Com isso quero dizer quais potências de sabor estão presentes na sua comida e na sua bebida. Então, por exemplo, se você só quisesse pensar em algo simples, como um peixe frito na praia, das barracas de praia, você não precisa de nada muito intenso, mas você tem um pouco de fumaça e um pouco de gosto de churrasqueira naquele prato, então algo como uma wheat beer(witbier) seria absolutamente fantástico. Uma lager decentemente complexa, possivelmente uma lager dry-hopped, funcionaria muito bem também, especialmente se o peixe for mais oleoso. Vai ajudar a cortar um pouco da gordura, mas você não precisa se complicar muito. Você também pode… – aqui eu vou começar a elevar o nível um pouco – digamos que você tenha algo como uma picanha, que eu sei que é um basicamente o prato nacional do Brasil, a partir daí você pode começar a olhar um pouco mais para outras coisas. Você tem reação de maillard na crosta da carne, você tem reação de maillard no malte, então você quer algo como uma vienna ou uma esb, que eu acho que vocês encontram muito por aí, mas uma vienna lager, por exemplo, é a combinação perfeita. Você tem o maillard da carne, mas tem carbonatação suficiente para cortar a opulência da carne ao mesmo tempo que tem uma combinação nos altos níveis de intensidade. 

Depois você pode começar a galgar. Das coisas com as quais você deve tomar cuidado, o amargor é uma das principais. De fato, bastante interessante. Eu penso que as pessoas não falam tanto sobre como as IPAs podem ir muito bem com certas sobremesas. Então, por exemplo, um posset(creme, normalmente de limão) ou um blancmange(tipo um flan) ou algo parecido, coisas muito frutadas e cremosas, então na verdade você tem uma grande oportunidade de inserir uma IPA para usar esse amargor para rebater esse excesso de dulçor, cortar um pouco da cremosidade enquanto eleva o nível da acidez. Você poderia ir em outras direções também, ao alcançar sabores mais potentes, profundos, chocolate amargo. Bem, coisas potentes como cozidos e comidas que são bem apuradas e dão camadas e mais camadas de saber, então você pode olhar para coisas mais complexas. E aí você tem ótimas cervejas que ou cortam ou complementam elementos como chocolate ou até uma cerveja de lambique ou até algo como uma imperial stout. Aí você só precisa ir tentando, voltando para aquilo “onde cerveja e comida se encontram”? Bem, elas se encontram como contemporâneas. Elas se encontram em todos os níveis como coisas que alcançam o mesmo ponto, no mesmo momento. Obviamente existirão sempre momentos que serão incríveis e nos quais você vai achar algo que não esperava vindo de uma cerveja super leve e de uma comida muito potente e vice-versa. Mas, de verdade, quer saber de uma coisa? É mais fácil começar de onde você se encontra, onde cerveja e comida se encontram na sua vida e aí começar a experimentar. Eu também diria que é sempre melhor começar com a cerveja. Se você conhecer bem, bem mesmo a cerveja que você bebe, eu te garanto que em alguma momento seu estômago vai dizer “Uou, isso combinaria muito bem com aquilo ou com aquilo outro” Então, nessa situação particular, é melhor ouvir seu estômago. 

 

Gabi Lando comenta: “Uma coisa muito interessante que a Melissa traz com toda a sua experiência em harmonização e escrita é o básico que muitas vezes a gente esquece ou que os profissionais da área esquecem que é… faça harmonização que te faça feliz. Então, não adianta ficar só pensando na técnica se aquilo não te agrada de alguma forma, né? Tem gente que não gosta de coentro, tem gente que não gosta de vários outros ingredientes. E aí, por que vai colocar ou se forçar a experimentar só porque alguém técnico disse que aquilo seria bom, né? Claro que a experimentação sempre é interessante, mas… Se não está no gosto do pessoal, não adianta querer forçar alguma coisa”

 

Queremos ouvir você sobre na sua visão da cena cervejeira inglesa como fica o clássico e as cervejas artesanais mais contemporâneas? 

 

Sobre onde se encontra a cena de cerveja britânica, acho que posso dizer que estamos em um bom momento e passando por uma turbulência ao mesmo tempo. Quero dizer, fomos afetados por uma série de fatores globais e locais, alguns que nós mesmos causamos, alguns obviamente fora do controle da maioria das pessoas. Mas eu diria que, nesse momento, nosso maior problema é que temos um governo que simplesmente não liga para negócios de menor porte. Um governo que só se preocupa em agradar o bolso das grandes forças econômicas. Isso, inclusive, afeta nossa população como um todo. Então, nesse sentido está sendo bastante difícil. Nós liquidamos(aqui no sentido de privatização) toda nossa produção de energia nacional, nossas ferrovias, nossa água e agora todos os recursos são devolvidos para os acionistas e não de volta para as nossas empresas estatais. Isso acaba sendo muito problemático. Consequentemente, o que acontece é que quando coisas como a guerra da Ucrânia acontecem nós acabamos tendo grandes problemas. Nossas contas de luz vão pro céu, enquanto no final estamos ajudando a subsidiar as taxas de luz da França, o que faz todo sentido, não é mesmo? 

Isso posto de lado, a cena britânica de cerveja é muito, muito vibrante tanto em termos de qualidade – muitas cervejas tradicionais sobrevivendo, cervejarias tradicionais sobrevivendo e obviamente temos uma grande quantidade de cervejarias contemporâneas aqui também, algumas, inclusive, você sabe, eu soube que esteve aqui, algumas que nasceram aqui e foram compradas por empresas maiores como a ABI, empreendimentos que foram tão feitos para serem vendidos que não consigo condená-los por terem conseguido. Você vê coisas como Beavertown e Camden e entende que temos lances interessantíssimos rolando por aqui no Reino Unido. Eu penso que o que se destaca nesse momento é seguir essa moda americana do “hiperlocal” Então, eu não vejo em um futuro próximo, na verdade não vejo nos próximos vinte anos – já que eu sinto que esses movimentos são cíclicos – uma compra massiva de cervejarias. Algumas poucas ainda vão acontecer mas nada muito grande. Sinto que iremos por outro caminho, que esse tempo já passou. Também sinto que a cerveja artesanal vai acabar se concentrando em balcões cada vez mais locais, empreendimentos que entendem o valor e tem a visão de que é necessária uma relação afetuosa com a comunidade. Honestamente, é onde eu acho que deveriam estar os esforços de todos nós nesse momento. Não tem como alguém bombar massivamente nesse momento, apenas não vejo acontecendo. Acontecerá em alguns casos, eu diria que a Índia é o próximo grande mercado, onde isso talvez aconteça. Em qualquer lugar eu não esperaria em pé. De verdade, eu acho que a Índia é o último grande mercado a ser explorado, talvez um pedacinho do sudeste asiático também, mas muito disso se perdeu. Bem, acho que a cena britânica de cerveja artisanal regrediu bastante em relação a sua aspiração de mudança. Bem, o momento do Rat Magnet Me Too que vivemos acabou não tendo o impacto que esperávamos. Desde a crise econômica, pandemia e outras questões essa pessoas voltaram a ser incluídas. “Colaboração entre homens com outros homens, cervejas de homens e mais homens…” acaba sendo decepcionante, pra dizer o mínimo. Ainda é muito branco, masculino…”macho branco hétero” infelizmente. Não existe muita segurança de que pessoas de outras origens terão oportunidades e, eu de fato, não sei mas o que eu poderia fazer para contestar isso mas tentarei e vou continuar. Outras diversas pessoas estão nessa comigo. É muito legal vindo de ser a primeira mulher até essa comunidade de escritoras de cerveja, eu devia falar fraternidade, na verdade. Não estar, de forma alguma, sozinha e ter várias pessoas elevando suas vozes comigo significa que eu posso dar um passinho pra trás e focar um pouco em mim, o que ainda parece estranho.

 

Falando com a Melissa, juíza de concursos ao redor do mundo, você nota muitas diferenças entre os mesmos estilos sendo produzidos em países diferentes? Tem alguma memória para dividir conosco sobre a sua experiência julgando cervejas no Brasil?

 

Melissa Cole analisando cervejaJulgar cerveja ao redor do mundo é o que eu mais gosto de fazer. Envolve viajar, envolve cervejeiros, envolve aprender sobre novas cervejarias, novos países e novas cenas. É incrível. Só tem recomeçado agora, já que sendo autônoma eu acabo tendo que bancar uma parte grande. É maravilhoso ver que vários países vão criando seus próprios estilos de uma forma moderna e contemporânea, o que é fantástico. Obviamente, no caso do Brasil é a Catarina Sour. Eu acho que sempre vão existir diferenças entre estilos semelhantes produzidos em países diferentes devido à necessidade básica de vender aquele produto para o seu mercado local e isso não seria o modo adequado de julgar cerveja sob uma perspectiva mais purista. Por isso eu tenho uma certa dificuldade de julgar com pessoas que não tem alguma flexibilidade em relação a estilo, direcionamentos ou possibilidades na dinâmica de júri. Por exemplo, uma das coisas com as quais eu tenho que lidar no Brasil é a questão da oxidação, já que o calor simplesmente é um fator relevante. É claro que muita cerveja chega um pouco “cozida”. Mas normalmente a cerveja que você está bebendo na mesa do júri é a: poucos goles, b:um tanto “choca” e c:normalmente não está gelada, o que é bom para notar certos sabores mas também ressalta eles. E eu penso que uma das grandes coisas que eu tenho notado em relação a muitas pessoas da comunidade dos júris de cerveja e que eu gostaria de dizer para qualquer um que faça parte disso e possa estar ouvindo: Estamos nos tornando maus e isso precisa parar. Pessoas chegam na mesa do júri com péssimas posturas e isso é bem problemático na minha visão. Isso é problemático, porque essas pessoas chegam na mesa com uma postura de “Deus do Céu, eu vou ter que julgar essas cervejas frutas.”, “ah, lá vem mais uma Hazy IPA”. Sabe de uma coisa? Esses estilos estão entre os mais bem sucedidos dos últimos anos. Então engole, lírio do campo. Coloca seu ego de lado. Sabe de uma coisa? Eu não gosto de Rauchbier(cerveja defumada). Já disse isso, está público. Eu posso julgar elas? Posso. Eu julgo elas? Julgo. Eu coloco minha opinião pessoal de lado? Coloco. Tem muito ego crescendo nas mesas de júri recentemente e isso precisa parar. Se não existissem as cervejarias, os prêmios, as medalhas, a vibração, a animação, o que é que a gente ia estar fazendo aqui? Que papel a gente tá desempenhando? Para as cervejarias é importante nosso trabalho, é importante dar um feedback bem feito. Eu não quero estar em uma posição de capitão de mesa e dizer para alguém, como se eu fosse uma professora de escola “Você não escreveu um feedback aqui”. Se a cerveja está cheia de diacetil, então escreva que ela está cheia de diacetil, porque sinceramente alguém comandando uma cervejaria profissional que entra em uma competição precisa saber de onde o diacetil está vindo. Se esse não é o caso, é só pegar um livro e aprender, mas se você não consegue, se tudo que você se preocupa em escrever é ruim, então vaza. Você não devia estar aqui. Isso posto, minha experiência como júri no Brasil foi ótima. Eu acho que existem competições muito bem organizadas por aí. Eu quero muito ir para o evento da Amanda, coisa que eu ainda não consegui fazer, só porque financeiramente acabou sendo impossível. E eu acho que é maravilhoso que exista em toda a América do Sul uma cultura de competição tão bacana. Espero também que esse desabafo sobre positividade seja ouvido por certas pessoas. Não me entendam mal. Se uma cerveja é terrível, a cerveja é terrível e existe muita cerveja ruim sendo produzida comercialmente e eu estou cansada de gentilmente dizer para pessoas nos balcões “ não, não é assim que a cerveja deve ser, eu sei que o produtor te disse que sim mas ou eles não sabem como deve ser ou estão um pouco cegos em relação a isso.” Isso é uma coisa que eu vejo com muita frequência. Pessoas nas cervejarias precisam fazer degustações, porque não é possível que todo mundo tenha um paladar aguçadíssimo, acreditem ou não. Eu sei, uma sala cheia de caras, eles não vão ficar muito satisfeitos ouvindo isso, mas você já fizeram um teste do off flavour de vocês? Ficariam surpresos com quantos são absolutamente cegos para certas coisas. De qualquer forma, apenas reiterando, adoro ir ao Brasil como júri, é maravilhoso. 

 

Você é uma voz importante no que diz respeito às denúncias sobre casos de abusos, assédio, sexismo etc. Você poderia nos contar um pouco do que aconteceu em relação a Brewdog e se algo mudou realmente por lá desde então? Você vê que atualmente existe um vento de mudança em relação ao papel da mulher no mundo da cerveja ou continuamos repetindo os mesmos erros?

 

Eu penso que a razão para essa lentidão na manifestação de relatos de abuso, assédio e sexismo é que quando Breanne e Rat Magnet começaram a falar sobre isso nos Estados Unidos e aí o movimento chegou aqui no Reino Unido parecia que exista uma força e uma segurança por trás. Agora novamente com a crise econômica batendo, pessoas precisando de empregos, é aí que ambientes com abuso, assédio e sexismo se proliferam, porque é um ambiente de medo. Minha preocupação é que existem pessoas em diversas instâncias me contando sobre ambientes tóxicos em que elas estão aprisionadas de certa forma, porque elas não podem fazer nada sobre isso e isso é um problema real. Minha principal sugestão é, se você puder, se junte a um sindicato. Apenas se junte a um sindicato, se sindicalize. É importantíssimo ter uma força numérica. Eu não me canso de pontuar isso. Sindicalize-se, se possível. Também, bem, crie grupos de WhatsApp, grupos de encontro, um universo em que você possa falar, ser acalentada, discutir, onde você pode chegar e falar “Ei, eu tenho um problema, alguém já passou por isso?” Vocês provavelmente já estão fazendo isso, porque, bem, vocês adoram WhatsApp no Brasil. Deixando as piadas de lado, é incrivelmente importante, particularmente se você faz parte de uma parcela marginalizada da indústria, que, vamos encarar a realidade, é onde se encontram mulheres e não-brancos, que você estabeleça as suas redes, que você construa a sua galera, porque essa é a melhor maneira de se fortalecer e, eventualmente, criar uma massa crítica com capacidade de exercer mudanças. Além disso, quanto mais falamos sobre essas histórias mais os olhos das pessoas se abrem. Alguns amigos meus, no passado, já me abordaram no passado dizendo “ em algum momento você exagerou contando o que você passou em busca de um efeito mais chocante?” Ao que eu respondia “se eu fiz algo foi subestimar, porque é muito difícil falar sobre”. Não é fácil falar sobre alguém que grita na sua cara, porque você acha que não é exatamente aceitável um bottom com um par de peitos ou porque você quase linchada em festivais de cerveja, pois denunciou um cara que me apalpou e acabou perdendo o emprego depois da minha denúncia. Quero dizer, não são coisas que você quer expor, mas você faz para que elas não aconteçam de novo. Então, o fato de pessoas que são aliados, na melhor concepção do termo, você acaba realizando que eles são, na verdade, aliados, no modo menos efetivo, porque não prestam atenção ao que está acontecendo em volta deles, mesmo quando acontece com pessoas que eles dizem se importar com. Por isso é importante, muito importante não só tornar público, mas seguir falando disso no privado também, porque você ficaria surpreso com quantas pessoas privilegiadas não sabem o que as pessoas que não tem esses privilégios passam.

Claro, tivemos no Reino Unido o caso famoso da Brewdog, veja bem, eu penso que algo tenha de fato mudado? Existiu mudança significativa? Eu não estou lá dentro mas provavelmente não. O que eu achei importante quando eu participei do documentário “The Truth About Brewdog” e também do podcast “The Good Shit Brewdog”, que eu gostaria que você pudesse ver e também provavelmente achar legendado online é que eu pensei que foi muito importante eles terem pintado o estado em que o mundo da cerveja artesanal se encontra. É importante destacar como eles chegaram lá e que táticas eles usaram. Assim, não digo só especificamente sobre a BrewDog, mas também penso, penso mesmo que é muito importante saber que é muito improvável que algo vá mudar em um patamar tático ou estratégico, o que pode acabar não sendo o melhor para a sua equipe. Quando uma grande empresa privada está envolvida, quando você está milhões e mais milhões de libras dentro de uma operação você acaba abrindo mão de tudo. Por isso acho importante sempre que alguém está pensando em crescer seu empreendimento, você quer ser a maior empresa que pode ou a melhor empresa que pode? Porque é muito raro que investimento industrial massivo faça o melhor produto. Você quer ser grande, quer vender, quer ganhar milhões, comprar uma ilha, um barco, bem, então você deve saber sobre quantos corpos você pretende passar. Apenas uma palavra de aviso. 

 

Você é autora de 5 livros importantes sobre cerveja. Na sua opinião sobre a literatura que você conhece do tema, quais são títulos indispensáveis para quem quer aprender mais sobre cerveja?

 

Melissa Cole e seu livro CRAFT BEERLivros. Bem, você pode achar todos, todos os livros de referência, os livros técnicos que quiser. Eu acho que um dos mais divertidos que eu li sobre cerveja é o Pete Brown’s Three Sheets of the Wind, que é composto por 300 bares em 13 países e a missão de um homem atrás do significado da cerveja. Acho absolutamente brilhante. Eu sinto que ele pinta toda a insanidade que a cerveja pode induzir e segue a linha do Hops and Glory no qual você pode ler Pete ter uma crise nervosa enquanto tenta levar uma IPA pelo mundo, simplesmente maravilhoso. Perdão, Pete, eu não devia rir do seu estado mental, mas foi uma delícia de ler. Eu penso que para mim é mais sobre essa cervejas, sobre esses livros que falam sobre uma certa cultura cervejeira que me interessam muito mais. Então, hmm, tem um livro de um cara chamado Tommy Barnes, chamado A Beer in the Loire, que é apenas uma série de erros e falhas hilárias na tentativa de colocar de pé uma micro cervejaria na França e admitir que algumas das cervejas eram só muito ruins. Coisas que no fim são sobre te tirar um pouco da bolha, lembrar a gente que nem tudo é uma grande indústria, um lado mais lúdico que fale com você intimamente. Eu acho que é maravilhoso. Tem aqueles que giram em torno da cultura da comida também. Gente como John Hull, o livro culinário da cerveja artesanal, dê uma chance. Leia algo ligado a uma cultura ao invés de meter a cara em um livro técnico e pense um pouquinho sobre. Obviamente vou pegar alguns louros por mim, porque ainda sou orgulhoso de Beer Kitchen – ainda disponível no Kindle. Leia outras coisas também. Leia sobre cidra, sobre vinho, leia também coisas que te dão prazer, porque aí você não vai sentir que está trabalhando. E tem aquele ditado. “trabalhe com o que você ama e não trabalhe nem mais um dia” ou, na verdade “trabalhe com o que você ama e nunca pare de trabalhar”. Então se até a leitura vai ser sobre o que você ama é bom rir um pouco enquanto faz isso ou uma boa refeição. Ou um ou outro. 

 

Se você fosse dar conselhos a uma pessoa que pretende abrir uma cervejaria, quais conselhos você daria?

 

Se eu tivesse algum conselho para quem está querendo abrir uma cervejaria, quais seriam? Meu conselho seria: engaje com a sua comunidade imediatamente, mesmo antes de colocar seus planos todos na prática. Dê uma volta, entenda o ambiente local, entre nos bares abertos, fale com os donos de bares, com os donos dos restaurantes locais. Pergunte às pessoas o que elas querem ver, quais são os problemas que elas lidam com. Por exemplo, muitas pessoas precisarem estacionar na área é um problema. Fosse esse caso, o que você precisaria fazer sobre? Você precisa trazer um ônibus fretado de uma área mais central? Você precisa que as pessoas entendam a dimensão da questão? Você vai precisar pedir permissão da prefeitura para ter três ou quatro vagas na frente da cervejaria? Você precisa ter certeza que o pavilhão da cervejaria está vazio, por exemplo? Eu sei que essas pequenas coisas parecem muito estúpidas e não tem nada a ver com cerveja. Certo, eu não posso te dar conselhos sobre fazer cerveja que não estará disponível em lugar nenhum. Se você me pedir para provar sua cerveja eu vou ser muito sincero com você. Nem todo mundo curte tanto, mas se você pedir, vai ter. Mas é muito mais sobre como você vai se integrar com seu ambiente local, porque, no fim, é de onde você  vai tirar sua renda. Eles vão querer comida? Vai ter um food truck lá? Você vai precisar pensar sobre uma cozinha? Você vai precisar pedir permissão na prefeitura para abrir uma cozinha? Você consegue assegurar que vai ter uma staff que consegue fazer rodar consistentemente uma boa cozinha? Você tem uma boa staff no seu balcão de torneiras? Porque eu te digo o que acontece. Se você tem pessoas que não ligam para quem está atendendo no seu balcão ou cervejeiros exaustos demais para repetir as mesmas frases “essa é nossa sour”, “essa é nossa witbier” ou responder inúmeras questões de nerds cervejeiros que vão bombardear eles, então não faça. Você vai arruinar sua reputação. Você precisa de um balcão, seu balcão está dando errado e sua trilha para o mercado está fechada. ABI está dando conta disso. As grandes empresas estão dando conta disso. Você está sendo amassado porque elas precisam desse crescimento, elas querem, estão comendo pelas beiradas, pois o mercado global está diminuindo e elas tem muitos acionistas para agradar. Você tem que entender que seu foco tem que ser o seu ambiente local. Tem que lembrar das pequenas coisas. É confortável? É acessível? Você fez questão de checar se seu menu é compatível com os adaptadores para deficiência visual e auditiva do Google? Consegue se assegurar que tem cardápios impressos? Todas essas coisas, essas pequenas coisas. Não tendo banheiros inapropriados cheios de barris e equipamentos. A quantidade de vezes que eu vejo isso, faz minha cabeça doer. Tenha certeza que tem banheiros o suficiente. Estou cansada de, como uma mulher, chegar no único banheiro e ele estar todo mijado. Não faça isso conosco, porque não voltaremos. Tenha certeza que tudo está limpo, justo e convidativo. Honestamente, aja como se seu pai ou sua mãe estivessem vindo jantar e você provavelmente vai acertar. Dê um jeito para que todos tenham onde estacionar, tudo esteja limpo, tudo possa ser acessado. Perfeito. Brilhante. Missão cumprida. 

 

Para encerrar se você tivesse um poder mágico por um momento e pudesse mudar alguma coisa no mundo da cerveja. O que seria?

 

Se eu tivesse um superpoder por um momento, eu gostaria que homens do mundo cervejeiro experimentassem o que mulheres, pessoas da comunidade LGBTQ+ experimentam. Eu, sinceramente, espero que isso criaria uma série de mudanças muito rápidas, porque eu só não acredito que eles saibam como é. Bem, eles não sabem, porque não viveram. Eles não sentem medo. E eu acho que isso é uma das coisas mais poderosas que poderia acontecer. Eu acho…eu provavelmente iria pegar todas as cervejarias britânicas que eu gosto e levar pro Brasil para que eu pudesse experimentar um pouco de brilho do sol ao invés dessa garoa horrorosa que eu vivo tendo aqui. Bem, qualquer um dos dois. Um é muito altruísta, o outro bem egoísta. Escolha o seu. 

 

 

✨Leia também: História da cerveja na América do Sul com Beber a História

✨O que bebemos durante o programa? Gabi bebe água e Saison da cerva Gaúcha; Lud bebe água e Leandro bebe Prussia Bier, a Brown Ale.

✨Agradecimentos de Melissa Cole: Eu só gostaria de agradecer a vocês pelo convite. Brasil, eu sinto saudades. Muito obrigada, Ludmyla, por ter me convidado para o podcast. É sempre um privilégio ser perguntada sobre essas coisas. Muito obrigada mesmo. Bem, se alguém quiser falar comigo, vocês me acham no Instagram @melissacolebeer. Eu só gostaria de dizer que espero que 2024 seja um ótimo ano para todos e que eu possa estar nas suas praias o quanto antes. De repente ainda esse ano, nunca sabemos. De qualquer forma, enquanto isso, se cuidem e muito obrigada.”

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