No início de Maio, feriado do dia de trabalho, me peguei pensando: “Por qual motivo troquei o descanso da minha casa para passar esse feriado prolongado trabalhando de forma voluntária?” Bem, em busca dessa resposta, resolvi escrever esse artigo sobre minha jornada com concursos de cervejeiro caseiro.
Sobre os concursos de cervejeiro caseiro
Há quase 5 anos, quando me inscrevi para um curso básico de cervejas, não conhecia nada. Não sabia a diferença de acidez e dulçor. Logo na primeira aula, saí encantado, apaixonado e algum tempo depois, entrei no mercado de forma profissional, para ser meu ganha-pão mesmo. Lembro de comentar com minha gerente que morria de medo de trabalhar com o que eu amo e nunca mais amar nada, e cá estou eu refletindo que em alguns dias fora do horário comercial, minha rotina também é sobre cervejas.
Pulando uns 2 anos, quando comecei a estudar, tive a oportunidade de julgar meu primeiro concurso de cervejeiro caseiro. Sentia-me inseguro, pressionado e até com falta de bagagem para a função. Lembro que, ao terminar, mandei uma mensagem para o organizador dizendo: “Caso apareça alguma reclamação, pode entrar em contato comigo”. Era meu primeiro concurso, minha primeira oportunidade de ajudar o mercado de alguma forma, de fazer parte daquele mundo no qual eu havia me apaixonado. Felizmente, não tive nenhuma reclamação, pelo menos não até hoje.
Depois disso, vieram muitos outros concursos, alguns que utilizavam um sistema automatizado e outros em que tudo era escrito a próprio punho. Alguns que pude julgar na minha cidade com amigos, outros em que fui a outra cidade julgar no calor de quase 40°C e até aqueles que julguei com a temperatura a 2°C. Nesse último caso, ficava muito feliz quando aparecia uma Doppelbock ou alguma outra amostra que me faria sentir um calorzinho no peito.
Durante esses concursos de cervejeiro caseiro, fui percebendo que sempre havia espaço para melhorar, e o quanto era legal a ideia de pessoas vindo de forma voluntária de diversas cidades e até estados para fazer parte daquele momento. E quando via essas pessoas vindo de longe, eu pensava: “Qual o motivo delas trocarem o conforto de suas casas, cidades, famílias para vir a outro estado?” Levantava teorias, especulações, mas nunca cheguei a uma resposta ou um achismo que me convencesse.
Durante esse domingo, ouvi um amigo dizer que estava ali para se divertir no processo. Achei uma resposta muito boa e me questionei como será que ele se diverte escrevendo 150 a 200 palavras a cada 15 minutos (ou menos, de preferência) e ainda assim segue todas as regras e parâmetros para fazer um serviço bem-feito. E isso por 6 a 7 horas, dependendo do concurso.
Em algum momento durante essa jornada, ouvi algumas pessoas dizerem que julgar concursos era só por status. Até entendo quando falamos dos grandes concursos e principalmente daqueles personagens que, durante sua jornada, não se apegaram tanto ao conhecimento técnico ou à dinâmica dos concursos. E quando ouço sobre isso, eu penso: “Qual o motivo delas trocarem o conforto de suas casas para tirar uma foto olhando para o copo?” Mas bem, esse é assunto para outro dia ou para uma mesa de bar.
Bem, se você chegou até aqui, deve ter percebido que o artigo não é sobre os aspectos técnicos de um julgamento ou como ser um grande juiz, até porque eu ainda estou trilhando esse caminho, mas sem previsão de chegar lá. Esse questionamento me fez lembrar do primeiro livro cervejeiro que li, “O Cerveja e Design”, que, além de todo o conteúdo sobre cerveja em si, os autores falam sobre a cultura do terceiro lugar, uma teoria que, de forma resumida, diz que o terceiro lugar é aquele onde nos sentimos bem, nos sentimos inseridos. A teoria propõe que o ser humano tem três lugares primordiais em sua vida: sua casa, o trabalho e o terceiro lugar, que acaba sendo um local de convívio social fora do ambiente familiar e profissional. Isto é, pode ser um bar, uma cafeteria, uma livraria ou qualquer local onde as pessoas se encontram e criam relações sociais.
Com essa lembrança, cheguei a uma conclusão que está longe de ser finalizada, mas acredito que algumas pessoas podem sim estar em busca de reconhecimento, o que não é um problema, afinal, o trabalho é voluntário. Outros, assim como eu, começaram nisso buscando conhecimento e a sensação de contribuir com o mercado cervejeiro.
E quando lembro daqueles que vão para se divertir, acima de tudo, entendo que o terceiro lugar pode ser entendido como o ambiente que os concursos proporcionam. É um lugar onde é possível experimentar novas cervejas, conhecer e conversar com outros juízes e, claro, se desenvolver. Em resumo, os concursos, ou terceiro lugar para os íntimos, atraem as pessoas por um único interesse em comum: a cerveja. Durante o processo, elas convivem em um ambiente de desenvolvimento, que, acima de tudo, é divertido, e muda a rotina do dia a dia. E é esse lugar que me faz acreditar que a união do mercado cervejeiro existe sim, pelo menos no âmbito dos caseiros.
Logo, vou saber responder: ‘O que aprendi organizando concursos de cerveja?’ Mas bem, por hoje é só!
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