Nessa edição do Surra de Lúpulo, nosso podcast sobre cervejas artesanais, conversamos com as sócias fundadoras da cerveja Corisca (até início de dezembro era chamada de Beneditas), Melissa Miranda e Eneide Gama, e com a Tayná Morena, do perfil @cervagram, sobre a presença da cerveja artesanal na periferia.
Consumo de cerveja artesanal na periferia
O primeiro tópico trazido é que o consumo de cervejas especiais na periferia, demonstra que o mercado artesanal é menos abrangente e inclusivo do que gostaríamos. Entretanto, para a Tayná, existem marcas e produtos que ajudam a introduzir a curiosidade aos paladares deste público, por exemplo as ditas cervejas puro malte. Enquanto isso, ela encara como o grande desafio para ampliar o consumo das especiais é a dificuldade do acesso aos produtos.
“A periferia bebe cerveja sim e se interessa por esse assunto. É só ter acesso a esse tipo de bebida.”
O difícil acesso a cerveja artesanal na periferia é causado pela falta de lojas especializadas, limitação às ofertadas nos hipermercados e os altos custos de fretes dos e-commerces.
Para Eneide, ainda tem a questão de compreender como o hábito de consumo de um público acostumado com litrão. Ou seja, nível etílico, quantidade e baixo preço. Ela acusa que precisa de muito trabalho para provocar a experimentação, inclusive disponibilizando as degustações gratuitas.
Elas aproveitaram para lembrar o começo da Corisca, que chegou a estar presente em 40 bares periféricos.
“Trabalhamos muito os bairros daqui. Campo Limpo, Lapão…” – relembra Eneide.
Além das barreiras para os consumidores, Eneide e Melissa apontam os desafios para empreender nesses mercados.
“A gente idealizou viver só de eventos e bares periféricos. Mas, o problema é maior. Para você tomar, experimentar e gostar. É mudança de habito.” – afirma Melissa.
“O empreendedor periférico não tem tempo para ficar testando. Ele faz a cerveja e já é para vender.” – conclui Eneide.
A cultura da cerveja artesanal atual, reforça as diferenças?
Eneide e Melissa relembram o início da sua carreira no mercado que, para diminuir essas diferenças, acreditam na economia solidária como um meio de trazer a cerveja artesanal pra periferia. Mas, que a forma que o mercado artesanal se apresenta para o mercado é completamente excludente.
“A gente consegue ver isso em qualquer evento que a gente vá, em qualquer bar de artesanal que a gente vá. O mercado é machista e elitista. Existem células como a Beneditas, a Implicantes… que estão se unindo para formar pontes com pessoas marginalizadas, de todos os tipos.” – concorda Tayná.
Tayná também provoca as ações e mobilizações das grandes indústrias de ampliar o consumo de novos estilos. Com muito mais força e capacidade de arriscar, as grandes marcas tem potencial para avançar esse mercado e conquistar esses consumidores mais rapidamente. Para Melissa, esse trabalho pode ser feito pela oferta de produtos e pela educação.
“Eu falo que é gerar atratividade. Na verdade, o que despertou o interesse na gente foi uma oportunidade de negócio. Uma oficina bacana que fizemos.”
Por mais que possa ser acelerado, a parte da educação é um processo naturalmente lento.
“É um trabalho de formiguinha que a gente tem que fazer. Toda cerveja que eu entrego hoje, na periferia, é como se fossem mil.”
A barreira dos insumos
Outro ponto destacado pela Melissa e Eneide é o alto preço dos insumos para se produzir cervejas. A Ludmyla lembrou a conversa que tivemos com a Ana Claudia Pampillón e com o Guilherme Hoffmann, quando indicaram que o investimento que se faz hoje na produção do lúpulo brasileiro é com vista de retorno daqui 15 anos ou mais e isso vai impactar no preço.
O preço é afetado não só pelo valor do dólar, mas também pela carga tributária que não é amigável.
“Com o dólar o preço dos insumos subiu demais e isso dificulta até o surgimento de novos caseiros.”
Papel da educação sobre cervejas na inclusão
Levantamos a questão sobre a educação, como é apresentada hoje em cursos do mercado, se ela não se torna mais hermética e dificulta a entrada de novos consumidores. O que foi um tema polêmico.
A primeira sensação, dividida pela Eneide é que o mercado precisa simplificar e deixar o tema mais lúdico.
“O mercado, realmente me faz sentir mais burra. Parece que cada dia eu sei menos” – ironiza Eneide.
Para Tayná, essa dificuldade não é algo acidental e tem como interesse manter o acesso limitado.
“Não é acidental que o mercado nos faz sentir o estrangeiro dentro daquele universo, dentro de suas confrarias e grupinhos de cervejas.”
O papel da educação é fundamental, mas é necessário compreender como e quando ela deve ser inserida. Já que o interesse pelo universo vai se abrindo ao pouco, a cada copo, de acordo com o paladar e isso tem uma escada de conhecimento.
“A educação tem que estar. Ela precisa estar. Só que ela não é uma forma de beber. Ela é uma ferramenta que é usada para a gente construir tais pontes” – aponta Tayná.
Iniciativas que trabalham para a inclusão
Listamos quais seriam as iniciativas que hoje apoiam e ajudam em aumentar a inclusão do público as cervejas artesanais. Foram lembradas:
- Afrocerva
- Buscapé
- Dutra Beer
- Edu Sena
- Favelado Cervejeiro
- Graja Beer – já batemos um papo com o Leandro Sequelle
- Implicantes – temos uma conversa inteira com o Diego.
- Macuco
- Mito
- Mulheres cervejeiras Gonçalenses
- Queer Beer
- Pretas Cervejeiras – temos uma conversa ótima com a Madu Vitorino.
- Projeto do ICB com a Graja e a Heineken
- Sapatistas – também temos uma conversa com a Roberta.
- Sara Araújo – claro que já conversamos com a Sara.
- Torneira Bar
Conheça mais sobre elas e as apoie da forma que você puder.
Neste programa a Tayná Morena bebeu a Lager, Leandro bebeu a APA e a Melissa e a Eneide beberam a IPA. Todas da Cerveja Corisca. A Lud, diferentona, bebeu uma Lagunitas.