No programa de hoje do Surra de Lúpulo, vamos longe! Hoje aterrissamos nossos microfones na Finlândia, e vamos conhecer um pouco mais sobre a cena cervejeira desse país com o convidado Bruno Stella, brasileiro, professor de ciências aplicadas e cervejeiro na Bocks Corner na Finlândia.
Deixamos o nosso agradecimento aos Mecenas Empresariais: Cerveja da Casa, Iris Pay, Cervejaria Uçá, Viveiro Van de Bergen, The Beer Agency, Prussia Bier e Passaporte Cervejeiro.
Como foi sua jornada de ir trabalhar com cerveja na Finlândia?
Bruno em 08’14’’: Eu fui estudar no ICB, fiz o técnico cervejeiro, depois fiz o sommelier de cerveja lá na Academia Barbanti, na época, que era a parceria com a Damen. E aí, só em 2017, eu tive coragem de começar realmente a trabalhar no mercado cervejeiro, mas não diretamente com cerveja. Eu abri um food truck, na época, que chamava La Crápula. E aí, qual que era a ideia? Era misturar cerveja com comida, já que não tinha grana pra abrir uma cervejaria e não tinha coragem de ir pro sistema cigano, me associei com a minha sócia na época, Nayara, que era chefe de cozinha, e a gente criou o La Crápula. Eu lembro que era uma coisa humilde, porque na verdade a gente começou com uma barraca, não era nem um food truck. Então era bem crápula mesmo, no começo, né? E aí a ideia era misturar um pouco da cerveja em si, incorporar a cerveja, os ingredientes cervejeiros no food truck. E aí, na minha cabeça, eu achava que iria ser um sucesso danado, porque a gente ia parar o truck em cervejaria, em tap room, em evento cervejeiro, e todo mundo ia… Que legal, era inovador, né? Pelo menos a gente fazia o nosso próprio vinagre de cerveja, fazia pão com farinhas de malt antes de virar cerveja, então farinha crua, né? Para adicionar sabor ali no pão, e fazia maionese com lúpulo, era tudo um… Aquilo girava em torno de comer cerveja. E aí, aquilo, em 2017 a gente abriu, foi dando certo no começo, mas a gente caiu naquela velha verdade, né? O mercado de cerveja do Beer Geek é pequenininho, né? Então no final do dia, me perguntaram se eu não tinha um lanche normal. E a gente começou a patinar naquilo, porque na nossa cabeça a gente achava que o mercado cervejeiro ia abraçar a gente, fazer parceria, mas no final do dia ganhei mais chingo que qualquer coisa. Aí uma vez empreendedor e trabalhando com cerveja, isso ainda tava em mim né. E aí na pandemia, tive um relacionamento remoto com uma finlandesa. Porque estava de graça no Tinder para mudar de localização. E aí foi, e quando acabou a pandemia, decidi visitar. E aí chegando na Finlândia me apaixonei, tanto pela mulher quanto pelo país. Comecei a pensar onde eu ia procurar emprego; tinha opção de voltar pro TI e continuar com a cerveja. E consegui com o meu currículo um emprego com cerveja no interior da Finlândia, sem falar finlandês.
Conta pra gente curiosidades da Finlândia! E qual a comida típica?
Bruno em 15’15’’: Bom, quando eu me mudei pra Finlândia, eu nunca cheguei a morar na capital. A cidade que eu morei de uma vez é Jyvaskyla e é mais frio porque é mais ao norte. E eu cheguei quando o lago estava congelando, as árvores lindíssimas. Mas o que me enganaram é que essa felicidade durou duas semanas! Depois dessas duas semanas você intercala. Tem uma semana merda e depois uma boa, aí depois de Agosto começa a chuva e os dias vão deixando de ser claros como antes até chegar num momento em que tudo congela. Eu escorregava na neve o tempo todo! Porque vira um sabão. Faz menos 30 graus na rua. […] A parte mais complicada além do frio é a escuridão. E aqui eles comemoram o solstício de verão, que são 24 horas de luz do sol. Só que aí no inverno é o oposto, onde tem dias de noite. Chega uma hora em que você acorda pra trabalhar a 8 tá escuro, ao meio dia tem um pouquinho de luz do sol, aí 3 horas da tarde já está escuro de novo. A vida se adapta ao meio. Agora, um prato nacional aqui é tudo envolto no salmão e salmão defumado. Tem todos uns pratos de salmão defumado. Tem sopa de salmão defumado, que falta tempero na minha opinião. […] Mas aqui tem a raiz de alcaçuz salgado e aí eles botam isso em qualquer coisa. Tem a Porter desse sabor, tem sorvete disso, comida de criança… No Norte da Finlândia tem muita carne de rena também.
Como é o mercado da cerveja na Finlândia?
Bruno em 30’00’’: Aqui tem uma coisa interessante que outros países do norte também tem que é a restrição ao álcool, e isso é muito sério aqui. Imagina o seguinte, estamos nós 3 aqui num sábado à noite e aí acaba. É proibido comprar bebida com determinado valor alcoólico depois das nove da noite. Depois disso tem que ir pro bar ou para algum restaurante. E a diferença do preço do mercado para o bar é 5 vezes maior. É muito caro sair para beber aqui. A primeira coisa que é interessante aqui é a restrição de álcool, você só pode vender no mercado até 5,2% de álcool. Além disso, tem que comprar em lojas estatais. Ela funciona em horário comercial e não abre aos domingos. A taxação da bebida aqui é por graduação alcoólica. Algo engraçado na Finlândia é que a Heineken não é forte aqui, nem a Ambev. Tem duas cervejarias que tem um império aqui, das cervejas massificadas. Mas por conta da graduação alcoólica, as cervejas artesanais podem competir de forma mais justa com as grandes marcas. Também tirou de mim uma pré concepção sobre o bebedor de cerveja, que imaginei que seriam mais sofisticados. Eles preferem uma American lager, não conhecem Coffee Porter etc. Aqui tem muitas opções de cerveja para beber, mas os consumidores preferem as cervejas lagers, massificadas. Ainda assim, a bebida alcoólica mais consumida da Finlândia é a cerveja.
Lud pontua a necessidade de educar o consumidor finlandês.
Você diz que a taxação do teor alcoólico impacta no valor da cerveja na Finlândia. Como funciona produzir cerveja entendendo essa taxação?
Bruno em 42’20’’: O grande desafio é por onde você vai escoar essas vendas. Aqui pra produzir as coisas é mais barato, a linha de crédito é mais barata quando você quer investir. Mas em contrapartida você tá com o cabresto na boca, porque você não consegue produzir diversos estilos por conta do teor alcoólico. E você só pode vender pelo mercado estatal e através de restaurantes. Você acaba tendo que adaptar esses estilos, fazendo uma versão session, menos encorpada e você vende como strong Ale. Você adapta o produto pra realidade daqui. Dentro do contexto de festival de cerveja, etc. É legal porque os mercados estatais fazem editais falando que desejam comprar um estilo específico. Essa mecânica é muito difícil de prever.
Lud pergunta se a facilidade de ingressar no mercado finlandês se deve a ele estar no começo da era das craft beers, nosso convidado explica que na Finlândia não tem curso profissionalizante de cerveja, então ele teve o benefício do seu currículo e experiência do meio.
Quais são as ameaças e oportunidades que você enxerga aí no mercado craft finlandês?
Bruno em 47’30’’: Existem algumas semelhanças com o Brasil. Uma coisa que todos nós queremos é elevar o status da cerveja como algo refinado. Fazendo isso, você pode cobrar pela experiência. Agora, os grandes desafios daqui são os seguintes; quando eu comecei a procurar emprego não só como cervejaria e no ensino acadêmico, fui muito feliz porque nas primeiras portas que bati, já tiveram interesse e aproximação. Quando eu estava nas primeiras aulas, de alunos de até 25 anos estudando hotelaria e turismo. Na primeira aula, estávamos estudando os estilos clássicos. E eles faziam uma cara como se não tivessem curtindo aquilo. E aí eu decidi perguntar quem não gostava de cerveja e metade da sala não gosta de cerveja de jeito nenhum! E a explicação era porque eles tinham bebida enquanto mais novos as cervejas mais baratas e enjoaram. E aí durante as degustações, quando saímos dos clássicos e fomos para as cervejas modernas, comecei a conquistar a turma e eles começaram a entender. Tem muita gente que fala que pastry stout não é cerveja, mas é preferível que bebam pastry stout do que nada. Tem que fazer a educação e treinamento de bar, e a melhor cerveja possível. Como só poderia vender a cerveja no bar, tem que fazer o treinamento do serviço, fazer direito.
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O que bebemos durante o programa? Bruno bebe Coffee Porter; Lud bebe Radler limão, da Opa Bier; Leandro bebe Distorção Conjuntiva, Captain Brew.