No programa de hoje do Surra de Lúpulo, vamos receber dois nomes ilustres do mercado de alimentos e bebidas para falar sobre atendimento, serviço e treinamento. Nossa conversa hoje é com Carolina Oda, há 16 anos no mercado gastronômico, consultoria e TED-X speaker, e Bia Amorim, gerente do Lepos bar, sommelière, publisher na Farofa Magazine e produtora na MB mel.

 

 

 

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Atendimento, serviço e treinamento

 

 

Quais são as falhas mais comuns no atendimento? E como corrigi-las no serviço e treinamento?

 

Foto de Bia Amorim
Bia Amorim (acervo pessoal)

Bia: Eu separei três itens que eu acho que são falhas de atendimento que me vieram primeiro. Eu não sei se tem essa ordem, acredito que até não, mas desconhecer o produto é uma falha no atendimento. E eu não estou falando sobre detalhes históricos, 1516 e detalhes de físico-química, tá? É não saber, por exemplo, da coxinha, isso e aquilo, cerveja… Não ouvir o cliente, não ouvir o cliente, não escutá-lo no sentido de entender o que ele precisa, independente do que seja, e… comportamento desleixado. Eu acho que são três coisas que atualmente me pegam.

 

Carol: Acho que essa parte de conhecimento de produto, isso é um dos top três aí mesmo, porque sem conhecer o cardápio, sem nunca ter provado, sem saber o sabor das coisas, fica muito difícil. Mas eu acho que o maior problema hoje do atendimento é um serviço passivo. O que eu quero dizer com isso é um serviço em que só faz o que o cliente pede. Ele não se coloca como anfitrião. Ele só faz aquilo que é solicitado. Ele não entende que ele é um grande vendedor, acima de qualquer coisa. Então, acho que esse é um dos principais pontos que a gente vê, assim, de erro de… Erro não, né? É uma característica que está rolando no atendimento geral. […] Mas as pessoas não têm consciência que elas fazem o próprio salário. Na gastronomia tem uma característica em que realmente existe uma comissão. Você é comissionado. Então, quando a pessoa se coloca passivamente, ela não entende que ela faz o faturamento daquela mesa. E assim, claro, tem cenários e cenários, tem bolsos e bolsos. Mas se você trabalhar num lugar que o tíquete médio é 300 reais… Tipo, em São Paulo, quem gasta 300 gasta 500. É só você ir lá e oferecer as coisas. Então a pessoa não tem essa… não se coloca nesse lugar de vendedor.

 

Para corrigir falhas desse tipo nos profissionais, Carolina e Bia concordam que é preciso estar sempre dando feedbacks e fazer o aprendizado ser parte da cultura empresarial.

 

Podemos dizer que o atendimento (ou serviço) tem correlação com um storytelling que o empreendimento quer contar para o cliente? Se sim, como a gente constrói essa história?

 

Carol: É uma construção que não é tão óbvia, mas quando a gente entra nas consultorias, a gente sempre chama a equipe de marketing, porque eu preciso de um direcionamento conceitual pra desenhar o estilo da operação. Então, se eu vou segurar o copo assim, ou assado, se vai ter bandeja ou não vai ter bandeja, qual o dimensionamento da equipe para aquele atendimento, quem vai me direcionar é o conceito, a cara, a identidade. Porque se eu pegar, o McDonald ‘s tem identidade, o Subway tem identidade, fica mais fácil de entender, assim como o restaurante dos tiozinhos ali da esquina que tem 50 anos tem identidade. E aí é muito difícil quando a gente chega e fala assim, tá, quais são os adjetivos do seu atendimento? E raramente os donos sabem responder isso. Ele fala, não, eu quero um atendimento excelente. Eu falo, não, mas… Eu falei, o drive-thru do McDonald ‘s é excelente também. A barraquinha de cachorro-quente é excelente. Cada um dentro do seu guarda-chuva. Então, sim, o atendimento, ele, não dito, inclusive, ele é uma tradução de uma identidade, que tem que ser colocada com palavras.

 

Bia: Massa. Eu estava pensando na questão de conceito, entregar o conceito, né? Que daí tem a ver com o… Tudo vai contar essa história. O ambiente, a decoração, o som, a temperatura, as cores, os uniformes. E esse tom de voz que você usa, né? Ah, quer alguma coisa? Olá, boa noite, como vai? Gostaria. Prazer, eu sou Beatriz, vou atendê-los hoje. Às vezes você não quer chegar num boteco e… Olá, boa noite. Não. Você não quer isso, entendeu? Então tudo vai contar uma história. E aí acho que em alguns casos… essa identidade é muito jogada também no atendimento, né? Então, eu acredito que super funciona. Quando você mandou essa pergunta, eu fiquei pensando na Carol, que eu estava vendo uns vídeos no TED também, que além da Carol, teve o Will Guidara, com a história dele do cachorro-quente, você que já esteve no Eleven Madison Park. Eu acho que é um lugar que você sentiu que tinha essa identidade, porque eu fiquei pensando nisso.

 

Carol: Não, tem. Acho que essa é a grande diferença. Por isso que o que faz um jantar custar 500 dólares e o boteco custar, às vezes, 5 reais, os dois são excelentes. É porque você tem as expectativas alinhadas com o que cada um tá se propondo a fazer. O que o Will Guidara quer fazer no Eleven é um negócio que… Só com muito dinheiro mesmo. Você tem que… Custa caro, né? Eu falo, quando eu fui no Eleven, eu falei que eu queria harmonizar com tudo, menos com vinho. E tinham 10 pessoas que entendiam de bebida na equipe. Óbvio que isso custa investimento no serviço e treinamento. […] O que a gente sempre faz com clientes, a gente tem vários clientes paralelos. Falo, bom, se tem um cliente que tem um vinho de mil reais na carta, eu falo, cara, você tem um vinho de mil reais na carta. Isso exige muito mais coisa. Não tem como. E aí você começa do banheiro ao jeito que você entrega a conta. vai estar pareado por você ter um vinho de mil reais na carta. Assim como você quer ser uma padoca de… Que o ticket médio vai ser 50 reais, tá bom. A gente pode colocar o botão, você vai apertar, o garçom vem até a sua mesa. Pode ter um copo de plástico e tal. O problema é quando isso está desalinhado.

 

Vamos falar do conceito de “experiência” do consumidor? Esse termo virou meio chavão, mas segue sendo amplamente difundido. O que vocês pensam sobre isso? E ele de fato é um fator determinante para aumentar o tíquete médio do estabelecimento?

 

Foto de Carolina OdaCarol: Eu acho que tem negócio que tem que ser só funcional mesmo. A experiência é só matar a fome mesmo. Eu ainda até no TED discuto muito isso, a fome física e tal, mas tem lugar que é somente sobre a fome física. E tudo bem. E tem lugar que é um luxo que não tem nada a ver com a fome física. Eu gastar 500 dólares num jantar, não é porque eu tô com fome. A última coisa que eu tô indo fazer ali é porque eu tô com fome. Então é você entender quando você está trabalhando com alimentação e quando você está trabalhando com entretenimento. Existe o entretenimento gastronômico, o entretenimento etílico e existe a alimentação. Então, até quando começaram as discussões sobre alimentação, eu estava falando, gente, calma. São dois negócios diferentes. Falar de alimentação como cadeia, país, não sei o quê. Eu falei, isso é uma coisa. A gente tá trabalhando com entretenimento que é o mesmo momento que a pessoa poderia ter ido num show, né? Então acho que cabe a você entender qual é o seu negócio. Mas a nossa área, depois do Instagram, gente, o Instagram fez a experiência também, né, essa palavra, virar… Quando eu tava na pizzaria lá do Rio de Janeiro, gente, eu nunca vi uma pizzaria em que a pizza mais vendida é a de chocolate. Somente porque é jogado chocolate na hora em cima da pizza e todo mundo filma pegando chocolate e jogando em cima da pizza. É isso né, então assim, a experiência tem várias conotações aí.

 

Qual é o desafio do recrutamento? Quais habilidades são necessárias para um atendimento de bar e restaurante? E quais são possíveis de serem ensinadas (ou treinadas) após a contratação?

 

Bia: O difícil é que tem gente que devia estar na TV, né? Não no balcão, porque a pessoa… Você chega, daí a pessoa: eu faço isso, faço aquilo, blá,blá, blá. Super animada e tal, você fala, meu caralho, é você, tipo. Aí você trabalha um tempo com a pessoa e ela não tá entregando aquilo, né? A gente vai desanimando no meio do caminho, às vezes, ou a gente finge que a gente tá disposto. Enfim, e na verdade acho que a grande dificuldade é o próprio recrutamento hoje em dia, sabe? A gente tem uma equipe hoje lá no bar, especificamente no Lepus, né? Onde talvez 85% das pessoas estão lá desde o começo. E eu acho também que é isso, é um ramo tão difícil que as pessoas que são boas em geral estão contratadas. E aí é aquela coisa, ah, eu vou lá no bar do outro falar, viu? E acontece porque eu acho que faz parte do mercado, né? A gente não tira ninguém de lugar nenhum. Mas é uma coisa que acontece. As pessoas vão sondando umas às outras porque simplesmente você coloca lá na Cato ou não sei aonde, vai chover 60 currículos, você vai ter que selecionar, as pessoas vão ter que ir. Às vezes elas não vão, mas vão ter que se enquadrar, elas vão ter que gostar do salário, do horário, da localização, da própria equipe, né? Eu lembro quando… Eu fui trabalhar no Mestiço, de garçonete em São Paulo, era tipo 2002, 2003. E aí eu fui na entrevista, e aí me chamaram para um teste, eu fiz os testes, enfim, um dia não fui, aí depois eu voltei. E aí eu descobri que esse tempo do teste, o dia você não vai, que eles perguntam para a equipe. E aí, vocês gostaram? Tipo, essa pessoa vai dar certo entre vocês? Porque às vezes você gostou, mas todo mundo odiou. Só você gostou.

 

Carol: A parte técnica ensina, que é uma teoria famosa do Danny Mayer, que é um dos papas da hospitalidade, que ele tem essa teoria do 51-49, que 51% seria comportamental, 49% seria técnico, que a gente sempre contrata. A gente contrata pelo técnico e demite pelo comportamental. O comportamento nem sempre você ensina. E ainda mais falando de pessoas, né? A hostilidade é relacionamento. Você pode vender gasolina, você pode vender roupa ou comida, é relacionamento. E aí é o comportamental. Então, que seja comportamental, lidando com a equipe, né? Então, por isso que é difícil, por isso que hoje a gente vê gente trabalhando mais com psicólogo. A parte técnica, gente, em uma semana faz uma pessoa virar garçom. Não tem problema. Isso é fácil. Agora, o… O resto ali…

 

Bia: Tem que ser uma pessoa de bom temperamento, até porque vai lidar com a equipe, vai lidar com o cliente, os diferentes tipos de clientes. E acho que pra mim, nesse ramo, uma pessoa gentil, ela sempre vai ter muitos pontos, porque ela vai ser gentil com o time, ela vai ser gentil com os clientes, é um negócio que a gente, sei lá, quando eu olho uma pessoa, a gente sabe que a pessoa… Ah, não! ela já tá ali, qualquer coisa que acontece na entrevista, você já consegue dar uma sacadinha você fala, putz, olha essa pessoa eu acho que pra hospitalidade a gentileza é essencial, mas quanto que a gente ensina de gentileza talvez só pelo próprio exemplo, né então…

 

Vamos falar de serviço e treinamento. Custa caro formar uma boa equipe? Como funciona o treinamento de uma brigada de bar, restaurante, hotel?

 

Bia: Eu acho que é barato treinar a equipe. Caro é você ter uma equipe mal treinada. 

 

Carol: Acho que tem um jogo, você pensar por faturamento, não é. E de salário, claro, um gestor, se você quiser fazer isso internamente. A gente tem uma gerência de 3 a 25 mil. Depende do quanto você quer resolver um BO. Aí a gente falou, o gerente ganha 25 mil? Eu falei, bom, se eu faturar dois e eu como dona não zapear no lugar, ele vale 25 mil, tá ótimo. Agora se eu faturar 100 e ele só vai abrir e fechar a loja pra mim porque é uma pessoa de confiança, pode ganhar, vai. Sei lá, sim. Então depende, tudo depende, né? A gente sempre fala, os salários, o que vai acontecer com as suas lideranças é uma subtração ali do que vai sobrar da sociedade. Quanto menos a sociedade entrega… mais parruda tem que ser a minha gestão interna, as minhas lideranças, e isso vai custar. Agora, se você quiser ter sossego como dono, custa. Se você, como dono, quiser também ser operacional e cuidar dos BOs todos, você pode ter uma liderança mais júnior, né? E aí, a coisa do treinamento, se eu, como gestora, tenho as ferramentas, eu vou diluir isso ao longo da minha cultura operacional e vou eu mesma fazendo. Agora… se às vezes o cara, ele faz a gestão, ele é da liderança, mas ele daí não sobra tempo pra ele treinar, aí ele vai ter que trazer isso de fora. Então, eu acho que é um quebra-cabeça, né?

 

Gostaram do episódio?

Agradecemos demais a presença de Bia Amorim e Carolina Oda no episódio de hoje.

 

✨Leia também: Cardápios para bares cervejeiros com Igor Barreto

✨O que bebemos durante o programa? Bia bebe suco de maçã fermentado; Carol, Lud e Leandro bebem água.

 

Nana Ottoni

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