No episódio 38 do Surra de Lúpulo, nosso podcast de cerveja artesanal, abrimos o ano de 2021 conversando com o sommelier de cervejas e analista de marketing da cerveja Felipe Freitas, sobre de onde veio e para onde vai o mercado de cervejas. E conteúdo sobre o tema não faltou, porque Felipe, um entusiasta do conhecimento cervejeiro, é criador do Catalisi, uma plataforma de inteligência de negócios para o mercado da cerveja que, através de divulgação de conteúdo analítico, prestação de serviços e treinamentos, contribui para a profissionalização do mercado cervejeiro para que os entusiastas desse universo se sintam mais aptos a trilhar histórias empreendedoras de sucesso.
Felipe, que é engenheiro químico de formação, conta que seu envolvimento com o mercado cervejeiro foi muito gradativo e começou quando trabalhou na AMBEV, há muitos anos atrás. Habituado apenas ao processo de produção em larga escala de cervejas pilsen, em determinado momento Felipe esbarrou com uma matéria sobre a cervejaria Colorado e, pela primeira vez, viu que existia um mercado de microcervejarias artesanais atuando no Brasil. “Foi nesse momento que o mosquitinho da curiosidade me picou e comecei a correr atrás de conhecimento, encontrar pessoas, fazer cursos. Nesse tempo também bebi muitas cervejas ruins até aprimorar meu critério sensorial”, relembra ele.
Turning point
Em 2015, já apaixonado pelo universo cervejeiro, Felipe decidiu abrir uma cervejaria cigana, mas o projeto não foi adiante no momento em que ele esbarrou com uma grande lacuna no mercado cervejeiro brasileiro: a falta de um conhecimento analítico estruturado do mercado das cervejarias no Brasil. “Fiquei muito impressionado quanto percebi que não havia nenhum tipo de informação de planejamento nessa área. Como um empreendedor começa sem dados concretos sobre o mercado em quer atuar? Foi nesse momento que precisei me voltar para o que havia de conhecimento lá fora e comecei a planejar o que seria uma plataforma de comunicação que oferecesse dados analíticos para o mercado cervejeiro”, explica.
O mercado cervejeiro nos Estados Unidos e o desafio brasileiro
Felipe falou muito sobre a trajetória das cervejas artesanais nos Estados Unidos, ressaltando a importância da construção desse mercado por lá para o crescimento de mercados similares ao redor do mundo. “Houve muitas fases ao longo da consolidação do mercado cervejeiro por lá, mas, ao longo dos anos 1980 as cervejas artesanais foram chamando a atenção dos grandes conglomerados. Esses fabricantes em larga escala perceberam que as pequenas produtoras eram laboratórios de inovação e uma das grandes viradas da popularização da artesanal por lá foi esse pricesso de aquisição das cervejarias menores. Essa associação a grandes empresas, já com capital, marketing e conhecimento em escala massiva, fez com que muitas cervejarias artesanais se tornassem gigantes internacionais, como a Brooklyn e a Sierra Nevada. A cerveja artesanal tem em si o valor da criatividade, da inventividade humana. As empresas querem estar perto desses produtores, querem agregar essas características”, explica Felipe.
O mercado por lá tomou uma proporção tão imensa que criaram-se regras operacionais diferenciadas de acordo com o porte das cervejarias e o governo mantém registro das empresas em operação, disponibilizando aos novos empreendedores uma base de dados de mercado muito rica, diferente do que vemos hoje no Brasil, um mercado ainda iniciante.
“Hoje existem pouco mais de mil cervejarias registradas pelo Ministério da Agricultura, mas o registro não garante que essa cervejaria esteja operante. Muitas microcervejarias nascem e morrem todos os anos e isso é muito comum. Nos Estados Unidos o registro é apenas das marcas em operação, o que nos permite observar que há anos o delta de crescimento por lá é positivo. Ressalto, no entanto, que enquanto aqui ainda estamos começando, lá eles já atingiram uma maturidade de mercado e hoje a Brewers Association investe cada vez mais na pauta da diversidade, a fim de chegar em públicos de outras origens, fora do nicho. A mensagem é: qualquer pessoa pode gostar de cerveja artesanal. Se as empresas não atingem uma margem maior do mercado, o crescimento logicamente vai cessar. O grande exemplo norte-americano para o Brasil de hoje é que as cervejarias artesanais sejam estimuladas a comunicar diversidade”.
Felipe destaca ainda que a trilha da inovação despertada pelo boom das cervejas artesanais no mundo, e no Brasil, traz em seu encalço uma explosão comercial em outros nichos de bebidas, sejam elas alcoólicas ou não. “Hoje, o leigo chega na prateleira de mercado e vê ao lado da cerveja artesanal, com seu rótulo bonito, uma bebida destilada enlatada, superdiferente e chamativa. Se ele escolhe a segunda e gosta do que experimenta, ele é pela curiosidade ele é fisgado para outro nicho. É importante que os produtores de cerveja artesanal entendam que seus competidores não são só cervejas, mas bebidas também de outros segmentos. Todo mercado é feito essencialmente de incertezas e é por isso que com o Catalisi eu trabalho a ideia de conectarmos conteúdo e pessoas. Quando lembramos que cerveja é cultura, e cultura é transmissão de conhecimento, fica claro que os caminhos do nosso mercado não serão delineados apenas por cervejeiros, mas por profissionais, informações e expertises vindas de muitas áreas”.