Mais um fim de ano que se aproxima, e os olhos do Surra de Lúpulo se voltam para o futuro da cerveja artesanal. O que nos aguarda em 2026?
Para tentar responder essa e outras perguntas, recebemos Bruno Moreno, da Cervejaria Dogma — que agora também é Mecenas Empresarial do Surra! Pincelamos um punhado de aspectos, da maturidade do mercado nacional a padrões e tendências de consumo que vêm e vão. Então aperte o play e vem com a gente.
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O mercado de cerveja artesanal chegou à vida adulta — e isso dói
O mercado de cerveja artesanal brasileiro entra em 2026 num daqueles momentos em que a empolgação dá lugar à maturidade. Além disso, os dados são teimosos: enquanto os Estados Unidos viveram momentos em que o craft chegou perto de 15% de participação, aqui seguimos estacionados entre 0,8% e 1%. A mesma estimativa que já se fazia em 2015. Fica a sensação é de que caminhamos, produzimos, inovamos, mas o tamanho do nosso espaço no mercado total permanece quase imóvel.
Bruno Moreno enxerga isso com clareza: o consumo não deve explodir em 2026. Consequentemente, o bolo continua do mesmo tamanho. O que muda é o número de pessoas dividindo ele. E esse número tende a cair. Sem romantização, basta olhar para o que mais tem girado ultimamente: tanques usados. Portanto, é o sintoma mais explícito de que a ressaca chegou para quem entrou sem base sólida.

Lud define esse momento como uma espécie de “limpeza de mercado”: marcas que nasceram do impulso de ter um rótulo próprio, de realizar um sonho, mas sem plano de negócio, capital de fôlego ou diferenciação real. Isso não é exclusividade nossa, os Estados Unidos passaram por dois ciclos assim. Entretanto, a diferença é que, para nós, ainda é a primeira grande onda de ajuste. Dói mais, mas é natural.
Dança das cadeiras entre grandes e pequenas
A questão que surge na sequência é inevitável: quem vai comprar quem? As grandes corporações, como Ambev e Heineken, hoje têm pouco apetite para novas aquisições e muito foco em enxugar portfólio. Além disso, a expectativa de que independentes comprariam outras independentes também parece distante: faltam caixa, estabilidade e, acima de tudo, uma estratégia muito clara para consolidar marcas. O exemplo recente da CBCA ilustra bem como consolidar sem fundamento pode virar um labirinto de perdas, promoções incessantes e dificuldade de gestão.
Por outro lado, Bruno vê espaço para grupos de bebidas que queiram diversificar portfólio e até fundos de investimento que, mais à frente, procurem marcas independentes maduras, com bom fluxo de caixa e imagem forte. Ainda assim, aquela fantasia romântica de que “o grande compra o pequeno porque admira o trabalho”, essa já ficou no passado.
Entre o hype cansado e o consumidor esquecido
Se existe uma ferida aberta no mercado, ela tem nome e sobrenome: o hype da New England IPA. Durante quase uma década, o estilo foi tratado como o centro gravitacional da cerveja artesanal. Assim, isso criou um problema: padronização. Bases muito parecidas, fermentação que puxa fruta em excesso, variações mínimas nos blends de lúpulo. Uma saturação sensorial difícil de ignorar, e que vem cansando quem bebe e quem produz.
Lud verbaliza o incômodo geral: ninguém aguenta mais beber a mesma coisa com rótulos diferentes. Bruno explica a origem técnica da monotonia: enquanto uma West Coast IPA permite que o lúpulo brilhe de verdade, a NEIPA leva tudo para o mesmo canto frutado. Consequentemente, quem gosta de nuances perde interesse. Quem gostava do hype, começa a buscar outra coisa.

Mas a solução não é trocar um hype por outro. Para Bruno, o futuro está em “pequenos hypes”: ciclos curtos de estilos clássicos, resgate da diversidade, noites em que se bebe quinze estilos diferentes… E não quinze latas iguais. Além disso, a Dogma já vem aplicando isso ao investir em lagers variadas, linhas belgas, estilos ingleses, Porters, Stouts tradicionais e experimentações mais secas e limpas, sempre fugindo da repetição.
Quem está bebendo?
Há outro ponto delicado: o consumidor envelheceu. A base que entrou no mercado há dez ou quinze anos está mais madura, com menos ímpeto para caçar novidade semanal e mais vontade de beber “cerveja com gosto de cerveja”. Assim, uma parte desse público se sente esquecida porque muitas cervejarias passaram a produzir apenas estilos de hype, e abandonaram a boa lager, a Pilsen bem feita, as belgas, as Bitters, as Porters “raiz”.
Educar sem ser arrogante vira necessidade estratégica. E isso não depende só das cervejarias: bares, taprooms, distribuidores e quem atende no balcão também têm papel decisivo. A diferença entre o que vende no bar e o que trava na distribuição mostra isso claramente. No bar, tudo vende; na distribuição, se não é IPA, trava. É o canal, não o estilo, que determina o apetite do consumidor.

E o “Ano da Lager”? Ainda não chegou, e talvez não chegue. Para uma lager artesanal ganhar grande escala, ela precisa competir em preço com Heineken, Spaten e Beck’s. A elasticidade do consumidor é limitada. Além disso, em bares, quando a Pilsen da casa está disponível, ela domina. Quando falta, a lager mais cara vende rápido, mostrando que as pessoas até pagam mais, mas não quando há comparação direta. É psicológico.
O debate sobre as cervejas sem álcool também entra nessa lógica. O mercado cresce, mas ainda é o nicho do nicho, e extremamente sensível a preço. Para Bruno, quem bebe cerveja sem álcool geralmente não gosta de cerveja. Mesmo assim, existem projetos sérios como ETAPP, Sim! Cerveja e Beba Lucy, que dialogam com públicos que vão além do beer geek: atletas, religiosos, pessoas reduzindo consumo ou que simplesmente querem “bebida de adulto sem álcool”. Ainda assim, esse segmento não será a salvação financeira das independentes.
Quais players ficam de pé em 2026, e como
No campo da distribuição e sobrevivência, o tamanho da cervejaria determina tudo. As grandes independentes precisarão jogar o jogo do autosserviço e do supermercado com produtos de maior volume e margens ajustadas. As médias, o “meio do sanduíche”, seguem relevantes para food services, restaurantes e bares especializados. Por outro lado, as pequenas e micro sobrevivem bem quando abraçam a venda direta: taproom, bar próprio, comunidade fiel e presença digital coerente.
Para o modelo cigano, o futuro é binário: quem trata o negócio como hobby ou aparece só quando dá vontade tende a desaparecer; mas quem opera com consistência, como a Spartacus, continua relevante. Portanto, o ponto central é foco: nicho claro, identidade, regularidade e produto que carrega o nome da marca. Não apenas rótulos colecionáveis.

Nessa dinâmica, “beber local” continua sendo essencial. A Dogma viu o bar da Santa Cecília crescer quase 50% em um ano, e as franquias seguem puxando o faturamento da marca. A loja online funciona bem como complemento, mas não substitui a experiência de bar, especialmente após a pandemia. Assim, é ali que a marca se afirma, onde o consumidor prova, conversa, retorna. E isso só funciona quando a cervejaria não concorre com o próprio parceiro oferecendo preços menores no e-commerce.
Passando a régua, de olho no que vem aí
A provocação final é inevitável: o futuro das independentes não será construído com hype, mas com fundamento. Além disso, compreender o tamanho do próprio negócio, saber qual canal faz sentido, entender o consumidor que envelheceu, resgatar estilos clássicos e comunicar com clareza, sem arrogância, serão habilidades essenciais para sobreviver ao próximo ciclo.
2026 não será o ano da explosão, nem o da catástrofe. Será o ano da maturidade. Menos espuma, mais substância, mais essência. Menos ilusão, mais estratégia. E, acima de tudo, a chance de recuperar aquilo que nunca deveria ter sido perdido: o prazer de beber cerveja boa, diversa e honesta. 🍻