“Furamos a bolha?” — a pergunta que tira o sono da Ludmyla Almeida volta ao microfone do Surra de Lúpulo, com Henrique Boaventura e o convidado Tiago Garcia, criador do Festival ISO. A conversa parte de um ponto incômodo: não sabemos nosso tamanho. Porque faltam dados sólidos de produção e consumo, e, sem régua confiável, é difícil planejar crescimento.

Mesmo assim, o Anuário do MAPA (publicado em agosto) dá uma pista crua: 5% das cervejarias (98 fábricas) produzem 99,2% do volume; os demais 95% (1.851) ficam com 0,8%. Esse é o contorno da bolha do mercado de cerveja independente no Brasil.

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O que é a bolha da cerveja artesanal?

Para Tiago, existem bolhas dentro de bolhas. Há o núcleo high-end (onde o Festival ISO vive), a bolha dos que já bebem cerveja mas não exploram o universo independente, e a bolha gigante de quem nem tem acesso por preço ou hábito. “Furar a bolha” é um processo de micro-furadas sucessivas, não um estalo único.

Em seguida, Henrique e Lud apontam outro obstáculo: quando qualidade vira glamour e julgamento, o discurso afasta. O vocabulário hermético e a liturgia sem acolhimento criam fronteiras invisíveis. Lá fora, na Bélgica e na Alemanha, por exemplo, a cerveja é comunitária: tradição, respeito e ritual coexistem sem distanciamento.

A bolha artesanal

Preço, cultura e o desafio do “beba menos, beba melhor”

Tiago traz a equação econômica: pós-pandemia, inflação e impostos elevaram custos. Assim, a cerveja artesanal passou a competir com vinho, whisky e RTDs (Ready to Drink, bebidas prontas) pelo mesmo bolso. Mudou, portanto, o custo de oportunidade. Não dá para vender litro a R$6–7, então precisamos explicar valor e dialogar com outros mercados.

E o mantra beba menos, beba melhor? Funciona no topo, mas soa elitista para a base. A mensagem precisa variar por público. O caminho é convidar, não julgar: usar estilos de entrada e comparações sensoriais (“parece espumante”, “lembra um drink”) para quebrar barreiras.

Festivais de cerveja: formar ou furar bolhas?

O Festival ISO nasceu como festival de cervejas extremas para se diferenciar de chopadas e eventos de massa. Hoje, Tiago o define como formador/reforçador de bolha — um centro high-end que encanta iniciados e surpreende curiosos.

Números que contam a história: mais de 50 cervejarias, 160 rótulos, 3.000 litros, cerca de 1.200 pessoas e ABV médio de 10%. O festival cresce 30% ao ano, mas ainda conversa principalmente com quem já está dentro da bolha. O próximo passo é descentralizar com pockets ISO, levando a experiência a outras regiões.

Festival ISO

A importância do atendimento no balcão

Se há um consenso, é este: o atendimento na ponta é o elo mais importante da cadeia. Uma simples pergunta — o que você gosta? — abre espaço para educar consumidores, fidelizar e atrair novos. Cada copo servido é uma aula! 

Mas não basta ter bons rótulos se o bar ou taproom não informa horário, endereço e cidade nas redes sociais. Comunicação clara e acessível é parte essencial de furar a bolha.

Cultura, hospitalidade e o “beba local”

Beba local pode ser bairro, cidade, região ou país. Em BH, capital dos bares, é comum achar cerveja artesanal em botecos. Mas muitas cervejarias ainda falham em criar ambientes family-friendly: falta conforto, cadeiras adequadas e espaços que acolham famílias.

Felizmente, existe alguns exemplos que funcionam e que podem inspirar:

  • No Mondial de la Bière, cervejas da Cozalinda e da Yarun foram apresentadas em uma degustação informal, quebrando resistências.
  • O Festival ISO levou cervejas históricas (como a lager alemã de 3,5% ABV da Dama), mostrando que cultura também atrai.

Dessa forma, ambientes de convivência e narrativas culturais são portas de entrada poderosas para novos públicos!

A disputa pelos pontos de contato

Enquanto cervejarias independentes lutam para se conectar com consumidores, as grandes marcas (Spaten, Beck’s, Heineken) ainda dominam bares com letreiros padronizados e investem em premiumização. E o movimento delas de sair da hospitalidade não abre espaço vazio, apenas desloca a disputa para outros pontos de contato. Logo, é preciso não perder isso de vista.

Bar flutuante da Heineken

Estratégias práticas para atrair novos consumidores

  1. Curadoria de porta de entrada: estilos leves e comparações sensoriais acessíveis.
  2. Treinamento de balcão: serviço qualificado transforma curiosidade em fidelidade.
  3. Ambientes familiares: conforto e acolhimento para todas as idades.
  4. Eventos descentralizados: pockets e feiras criam constância.
  5. Storytelling verdadeiro: conte a história por trás de cada rótulo.
  6. Mensagens segmentadas: não use um discurso único para públicos diferentes.
  7. Presença digital organizada: site e redes sociais claros, com informações básicas.
  8. Linha premium acessível: degraus de entrada com preço competitivo.

Conclusão: mais agulhas, menos estalos

Furar a bolha não é explodir um balão, é costurar o mercado com várias pequenas ações: atendimento, hospitalidade, eventos, narrativas e comunicação.

O Festival ISO segue como coração high-end, enquanto bares e feiras podem ampliar o pulmão. O caminho é consistência: uma conversa por vez, um copo por vez, até finalmente a bolha virar comunidade.🍻

Gabriel Gurian

Historiador, com Mestrado e Doutorado pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), meus estudos são pautados por bebidas e bebedores na história do Brasil, em diferentes períodos. Atualmente integro o projeto Comer História, desenvolvo pesquisa pós-doutoral na Universidade de São Paulo (USP), com foco no nascimento da cultura cervejeira brasileira no século XIX, e colaboro com o Surra de Lúpulo.

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