O episódio 11 do nosso podcast sobre cervejas artesanais, Surra de Lúpulo, vem com ‘ar mafioso’ e cheiro de tabaco: Daiane Colla explica harmonização de cervejas com charutos. Formada em Jornalismo, Daiane chegou a trabalhar em redação por muito tempo até embarcar no mundo cervejeiro. Há 3 anos, começou a fazer harmonização de charutos com cervejas, prática ainda muito recente no Brasil, segundo ela.
Sommelier de cervejas e estudiosa dos charutos, Daiane conta que seu interesse pelas craft beers começou em 2011. Em 2013, fez o curso de formação em sommeliaria e começou a trabalhar com cervejas artesanais, chegando a fazer assessoria de imprensa para uma microcervejaria. Já a paixão pelo tabaco começou há quatro anos, pensando em harmonizá-lo com cervejas, criando novos sabores:
“Todas as indicações de harmonização com charutos eram com bebidas destiladas ou vinhos fortificados, tudo com uma graduação alcoólica que eu não queria. Fui pesquisar e ainda tinha pouca informação sobre harmonização de cervejas com charutos, então foi na base do teste. O charuto veio agregar uma nova característica a isso tudo”.
Charuto não é cigarro
Conversamos com nossa convidada sobre as diferenças entre charuto e cigarro. Daiane explica que ambos possuem nicotina. Porém, o tabaco utilizado para fazer o charuto passa por um processo de fermentação e envelhecimento para arredondar os sabores e retirar impurezas das folhas. Além disso, o cigarro possui mais de 4 mil componentes químicos que prejudicam o organismo. O charuto contém apenas a nicotina, em grande concentração, motivo pelo qual não é indicado tragar a fumaça, degustando apenas o sabor na boca:
“É pra ser um momento de prazer: colocar a fumaça na boca, deixar por um tempo e soltar”.
Por onde começar?
Perguntamos pra nossa especialista quais os pré-requisitos para ingressar no mundo dos charutos. Para Daiane, o principal é começar com charutos de qualidade, buscando lojas de confiança que vendam só produtos originais.
Colla também explica que é preciso verificar se o produto está bem armazenado, se tem uma capa lustrosa com uma folha inteira bem preservada e, principalmente, ao levá-lo ao nariz, deve-se sentir o cheiro do tabaco e não o de cinzas como nos produtos de má qualidade. Sobre a intensidade, Colla explica que os cubanos costumam separar em 5 níveis: o suave, o suave a médio (que ao longo da fumaça vai mudando), o médio, o intenso a robusto e o robusto. O ideal é começar pelos tabacos mais suaves.
“Você pode começar fumando e degustando charutos a partir das cervejas que você gosta. Se você adora beber IPAs, você tem que harmonizar com um charuto que tem características que se assemelham às IPAs, por exemplo”.
O charuto perfeito…
Daiane também fala que ninguém é obrigado a fumar um charuto até o final. Por isso o ideal é começar pelos de tamanho menor, com menos intensidade de sabor. Se um charuto leva 30 minutos para queimar, mas depois de 15 você já cansou, não precisa fumá-lo inteiro. Porém para Colla o ponto ideal é quando ‘amargar’: “bem no final ele vai intensificar o sabor por estar muito quente e vai amargar. Essa é a hora mais apropriada de apagar”.
Sobre reacender o charuto que você apagou previamente, Daiane garante que o sabor não será o mesmo uma vez que o charuto continua queimando por dentro mesmo depois de apagado, através da transferência de calor para as folhas, liberando os óleos produzidos na fermentação, maturação e envelhecimento do fumo. Esses óleos terão evaporado ficando apenas as folhas secas.
Harmonização de Cervejas e Charutos
Leandro quis saber sobre as regras básicas da harmonização de charutos e cervejas. Colla explica que são basicamente as mesmas regras de qualquer harmonização: pode ser feita por contraste, dependendo da intensidade da fumaça na boca, gerando uma maior necessidade de limpar as papilas gustativas, precisando de algo mais forte e ácido.
Também é possível harmonizar por complementação e por semelhança. Um exemplo incrível foi com a cervejaria “Dádiva”, que produziu em parceria com a “Dannemann” um charuto com um blend exclusivo. Depois, criaram uma cerveja para harmonizar, encontrando características de complementação e semelhança:
“O mais interessante foi que as pessoas conseguiram criar um terceiro sabor: quando começamos a tomar a cerveja e fumar o charuto juntos, apareceram notas de frutas vermelhas que não existiam em nenhum dos dois”.
Confira nosso papo com o pessoal da “Dádiva”
Lud perguntou sobre os apetrechos que sempre acompanham o ritual de uma boa degustação. Colla fala que o básico é ter um cortador e nunca usar a boca ou tesoura para cortar o charuto. Ela diz que quanto mais pesado for, mais fácil fica de usar.
Depois, é preciso ter um isqueiro, mas é muito importante que seja do tipo “maçarico”, pois o fluido que vai dentro dos acendedores comuns não é favorável à queima do tabaco e altera o sabor do fumo. Na falta do maçarico, é possível usar as folhas de cedro, que geralmente vem dentro das caixas ou enrolando os charutos. Se nenhuma folha de cedro estiver disponível, pode ser um palito de fósforo.
“A ideia é tornar o charuto algo mais popular, buscar novos apreciadores, ser algo mais leve, mais agradável, que une as pessoas num momento de contemplação e relaxamento”.
Para acompanhar nosso papo, Lud bebeu uma Hyperspace da “Koala”, Daiane bebeu uma ALE da “Duvel” e Leandro uma Stout da “4 graus”.